terça-feira, 16 de outubro de 2012

FABRÍCIO CARPINEJAR - Meu sonho de casamento

Meu sonho é subir ao altar. E uma mulher alucinada gritar do fundo da igreja:

– Não, ele me pertence, eu ainda o amo.

Seria o máximo. O pianista buscaria despistar o pânico tocando Princesa Diana, de Elton John, haveria uma agitação febril no átrio, burburinho e gemidos frenéticos entre os convidados, o padre se manteria de boca aberta, a noiva iria me fuzilar:

– Quem é ela?

Explicaria baixinho no ouvido que é uma antiga namorada sem importância.

Todos os olhos estariam voltados para minha boca, eu roubaria a cena. Finalmente veriam que meu terno preto era Armani, que custou tão caro quanto o véu e a grinalda.

Para manter o suspense, não responderia no ato, giraria o rosto indeciso para o lado esquerdo e direito, como torcedor em partida de tênis. Até emitir a sentença:

– Eu amo minha noiva. Você é passado. Some daqui!

Depois do susto, garantiríamos nosso futuro. Nenhum incidente poderia nos separar de novo.

Ela completaria bodas de ouro comigo, jamais cogitaria a distância, permaneceria fiel vida adentro.

Nada como o pânico para renovar os votos de felicidade. Nada como um dilema para fortalecer decisões.

A reconciliação necessita acontecer antes mesmo da briga. É o medo de perder o par que reforça nossa entrega.

Orgulharia sua família e amigos ao descartar publicamente uma rival, ao mandá-la embora desprovido de piedade.

Aquilo seria a maior prova de amor. Muito melhor do que ser casto em festa de solteiro.

Receberia a confiança eterna de sua aliança, a cumplicidade delicada de sua fé.

Mostraria que sou o tipo ideal, sério e devotado: não estraguei a festa, não humilhei seu vestido, venci as tentações egoístas.

Deveria existir um serviço para contratar “loucos da igreja”. Senhoritas e senhores, disponíveis em books nas agências de publicidade, preparados para protestar no casório.

Contidos no princípio da cerimônia, romperiam o corredor com estardalhaço na hora em que o padre falasse: “Se alguém tem algo contra este casamento, que diga agora ou cale-se para sempre”.

Assim como as carpideiras, recrutadas para chorar em velórios, formariam uma nova categoria profissional, um time de lindos modelos provocando ciúme no noivo e na noiva e apimentando o relacionamento.

Seriam atores e atrizes dramáticos e desesperados realizando uma intervenção amorosa e criando intrigas existenciais.

Todo não pede um sim. Todo governo requer oposição.

Casamento de sucesso depende de torcida contrária.

ZERO HORA
16/10/2012 

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