quinta-feira, 18 de outubro de 2012

Marido e marido. Mulher e mulher - Flávia Ayer e Paula Sarapu‏

Novos dados do IBGE mostram que minas, conhecida por ser tradicional, é o terceiro estado com mais homossexuais vivendo juntos. Tiradentes e duas cidades da Zona da Mata estão entre as cinco do país com maior percentual de gays sob o mesmo teto 
 

Flávia Ayer e Paula Sarapu


Apesar da fama de tradicional, Minas Gerais é o terceiro estado onde há maior concentração de casais gays morando sob o mesmo teto, atrás apenas de São Paulo e Rio de Janeiro. A constatação vem de dados do Censo 2010, divulgados ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Pela primeira vez, o órgão investigou a fundo famílias formadas por homossexuais e identificou que, do total de 67,4 mil casais gays que vivem juntos no país, 4,9 mil (7,3%) moram em Minas, que ainda figura no topo de outro ranking: Tiradentes, nos Campos das Vertentes, e Rodeiro e Pequeri, na Zona da Mata, estão entre as cinco cidades brasileiras onde há, proporcionalmente, mais gays que decidiram juntar as escovas de dente. 

O Censo 2010 mostrou também que a maioria quase absoluta dessa população vivia em união consensual. Mais da metade desses casais se encontrava na Região Sudeste e que um quarto dos casados com pessoas do mesmo sexo tem nível superior completo. A maioria dos homossexuais entrevistados se declarou católica (47,4%), seguida por pessoas sem religião (20,4%). 

Apesar da vida a dois assumida por homossexuais, Minas mantém comportamentos conservadores e, 10 anos depois do último Censo, continua com o menor percentual do país de casais vivendo em união consensual, 25,9%. O número, entretanto, representa um salto significativo, se considerado que, em 2000, apenas 18,8% dos casados em Minas viviam em união consensual, mas está longe de alcançar os 36,4% no Brasil em 2010.

De acordo com a demógrafa do IBGE Luciene Longo, Minas é um estado onde a força da religião e dos costumes se mantém, mas, por ser o segundo estado mais populoso, acaba tendo peso maior na ruptura dessas tradições, caso das uniões homoafetivas. “Como Minas tem uma população grande, com mais de 19 milhões de habitantes, é natural que tenha número maior de casais de homossexuais”, afirma Luciene.

Traços mais liberais estão presentes em municípios do interior, figuram no topo do ranking das cidades com maior concentração de casais homossexuais vivendo sob o mesmo teto, em relação ao total da população. Com 6,9 mil habitantes, Tiradentes, a 190 quilômetros da capital, é a terceira na lista, atrás apenas de Águas de São Pedro e São João de Iracema, ambas em São Paulo. A cidade histórica é seguida por Pequeri, com 3,1 mil moradores, e Rodeiro, com 6,8 mil pessoas. 

Enquanto a média nacional é de 0,03% dos cônjuges morando com pessoas do mesmo sexo, Tiradentes, Pequeri e Rodeiro têm percentual de 0,14%, 0,13% e 0,12%, respectivamente. “Primeiramente, há de se considerar que tratamos de números pequenos. Apesar disso, observamos que todas as cidades estão próximas do Rio de Janeiro, um estado mais liberal”, avalia Luciene.

O jovem tiradentino Rodrigo Giovani dos Santos, de 27 anos, ilustra bem essa estatística. Ele mantém união estável com o contador Igor Vanucci Gonçalvez Jacques, de 26, que há dois anos se mudou para a cidade histórica, onde os dois vivem juntos. Rodrigo trabalha numa pousada e acredita que a diversidade de frequentadores de Tiradentes estimula um perfil mais liberal. “Apesar de ser uma cidade religiosa, não há preconceito. Minha família também tem princípios bem mineiros, do interior mesmo, mas recebeu o Igor muito bem”, conta Rodrigo, que é católico e quer passar a união estável para casamento, para adotar uma criança. 

Segundo o rapaz, Tiradentes recebe bem os casais homoafetivos. “Nossa cidade é muito tranquila e o número de gays vem aumentando nos últimos anos. Creio que eles se sentem bem por aqui”, diz. “Vamos juntos ao bares, andamos de mãos dadas quando queremos e não percebo olhar torto para a gente. Só vi isso uma vez, mas nem partiu de morador, foi um turista que falou bobagem”, conta Igor, que é budista. “Nós dividimos as despesas e tudo o que compramos para a casa. A gente curte ficar em casa juntos e aproveitamos bastante a companhia um do outro nos eventos da cidade”, acrescenta.



ESCOLHA SEM MEDO

Juntas há 18 anos, as professoras Celeste Libania, de 43 anos, e Rosane de Almeida Pires, de 47, de Belo Horizonte, veem uma realidade diferente da qual enfrentavam e já começam a expor sua opção sexual numa sociedade mais receptiva e respeitosa, acredita Celeste. “As mulheres já andam de mãos dadas nas ruas e isso era impossível para a gente”, conta ela, que ainda se sente desconfortável em demonstrar esse tipo de carinho em determinados lugares. 

Celeste lembra que os homossexuais da sua geração levavam mais tempo para assumir a escolha. No caso dela, isso ocorreu aos 25 anos, depois até de se relacionar com homens. Ela diz que a sociedade passou a discutir mais o assunto, deixando de acreditar nos estereótipos. “No passado, a gente se descobria ou se revelava bem mais tarde. Mas acho que essa tranquilidade crescente que a gente percebe nas ruas com os homoafetivos está ligada à forma como nos colocamos diante da sociedade. Na minha época, a sociedade era mais preconceituosa e a ideia que se fazia era de promiscuidade. No país, 53,8% dos casais homossexuais que moram juntos são mulheres, segundo o Censo 2010.

Para o coordenador geral do Movimento Gay de São João del-Rei e Região das Vertentes, Carlos Bem, Tiradentes é uma cidade gay friendly. “Os eventos que movimentam a cidade sempre recebem muita gente de fora, inclusive homossexuais. Vem muita gente de outros estados e outros países até para abrir restaurantes e pousadas. Essa pode ser uma das hipóteses para a cidade estar se destacando dessa forma.” 

Raça predomina na escolha de parceiro 
Publicação: 18/10/2012 04:00
Brasília – A pesquisa do IBGE comprova que a raça é fator predominante na escolha de parceiros conjugais. Dados do Censo 2010 mostram que 70% dos casamentos no país ocorrem entre pessoas de mesma cor e que as mulheres pretas (7% da população) são as que menos se casam. Entre os fatores que levados em conta na escolha de um parceiro estão a renda, a educação e a cor ou raça. São esses quesitos que influenciam a miscigenação e a mobilidade social, explica o pesquisador José Luis Petruccelli.

Nos últimos 10 anos, as uniões em função da cor ou raça praticamente não se alteraram. Em 2010, 69,3% das pessoas se uniram a outras de mesma cor ou raça, sendo que, em 2000, eram 70,9%. Se os casamentos não fossem influenciadas por questões raciais, o índice deveria ser em torno de 50%, embora já tenha sido de 80% em 1980.

“Isso desconstrói o mito da altíssima miscigenação e da harmonia racial. Há uma seletividade, há um viés pela escolha do parceiro por cor ou raça”, disse Petruccelli. Como os pretos e pardos (negros) estão entre os grupos com menor rendimento e nível de instrução, o pesquisador lembra que há uma “justaposição” de fatores que indicam uma “racialização” na escolha do parceiros.

O casamento entre pessoas de mesma cor ou raça é maior entre os brancos (74,5%), pardos (68,5%) e índios (65%), neste caso, relacionado à preservação dos povos. Entre homens e mulheres, chama a atenção a maior possibilidade de mulheres pretas ficarem solteiras. Entre as brasileiras com mais de 50 anos, elas são maioria na categoria “celibato definitivo”, que nunca viveram com cônjuge.

Atualmente, 68,2% da população se casaram com pessoas do mesmo nível de instrução. As mulheres são mais exigentes, nesse critério. Do total de profissionais com ensino superior completo, 51% delas escolheram homens desse grupo. Entre eles, 47% fizeram escolha semelhante.

NÚMERO DE CASAIS SEM FILHOS AUMENTOU 
Publicação: 18/10/2012 04:00

Filhos estão perdendo espaço na família brasileira. De acordo com o Censo 2010, mais de um quinto (20,2%) das famílias era formado por casais sem filhos, enquanto em 2000 esse percentual era de 14,9%. Minas, apesar de uma diferença mais pequena,  apresentou também acréscimo no número de casais sem filhos (de 11% para 13,4% das famílias).

De acordo com a demógrafa  Luciene Longo, o aumento está ligado tanto à opção por não ter herdeiros, mas também ao fato de casais estarem postergando a paternidade. “Há também influência de maior expectativa de vida, os filhos se casam e os pais continuam morando sozinhos”, comenta. O Censo também mostrou que 13,1% das famílias em Minas são formadas por mulheres sem marido e com filhos, enquanto o contrário, quando o marido vive sozinho com os filhos, representa apenas 1,9%.

O Censo mostrou um aumento das famílias sob responsabilidade das mulheres, que passou de 22,2% em 2000 para 37,3% em 2010. Uma novidade foi a investigação sobre a responsabilidade compartilhada entre o casal. Nos domicílios ocupados por apenas uma família, 34,5% estavam nessa condição, o que soma 15,8 milhões de casas.

De acordo com o técnico do IBGE Gilson Mattos, nas famílias secundárias, que convivem com a principal, foi verificado que 53,5% são chefiadas só por mulheres. “Provavelmente, por conta de um divórcio, uma filha volta para a casa dos pais ou a filha tem um filho, mas não contrai matrimônio, continua na casa dos pais.”

Outro dado divulgado foi o aumento na proporção de unidades domésticas unipessoais (com apenas um morador), que passaram de 9,2%, em 2001, para 12,1% em 2010. A coordenadora da pesquisa, Ana Lúcia Saboia, explica que, em muitos casos, são idosos cujos filhos já saíram de casa e perderam seus cônjuges. 

FAMÍLIAS RECONSTITUÍDAS


Pela primeira vez, o Censo 2010 incluiu no questionário aplicado a todos os domicílios a pergunta sobre a situação dos filhos nas famílias. Foi verificado se o filho é do casal, apenas do responsável ou apenas do cônjuge, além de outras configurações. A coordenadora da pesquisa, Ana Lúcia Sabóia, chama a atenção para essa nova classificação, chamada pelo IBGE de famílias reconstituídas, que somam em torno de 16% do total.

“Até então, pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) e pelo Censo, o Brasil era um mar de tranquilidade, todo mundo era casal com filho, mas você não sabia filhos de quem eles eram. Esse perfil mudou um pouco, tem a ver com o senso comum, de que hoje está havendo mais divórcios, as pessoas se juntam em configurações que não são as tradicionais. Você ouve falar do casal: o meu filho, o seu filho e os nossos filhos”, explicou.

O Censo 2010 registrou 57 milhões de unidades domésticas. Desse total, quase 50 milhões eram habitadas por duas pessoas ou mais com parentesco. Mas a pesquisa mostrou que existem 4 milhões de unidades domésticas com famílias conviventes, proporção que subiu de 13,9%, em 2001, para 15,4%. Além disso, 91% dessas têm apenas dois núcleos familiares, mas 3,6 mil casas tinha cinco ou mais famílias.

Gilson Mattos ressalta que a maioria das famílias é do tipo mais tradicional.  (FA e agências)


EMIGRAÇÃO
Minas Gerais é o estado com maior população morando fora, de acordo com o dados do Censo 2010. São mais de 3,6 milhões de mineiros, o equivalente a 13,6% da população, residindo para além das divisas estaduais. A maior parte teve como destino o estado de São Paulo, onde moravam, em 2010, 1,6 milhão de mineiros. Entre chegadas e partidas, Minas perde mais população do que ganha e, apesar de contabilizar mais de 21 milhões de pessoas naturais do estado, tem 19,8 milhões de habitantes. Depois de Minas, Bahia (3,1 milhões), São Paulo (2,4 milhões) e Paraná (2,2 milhões) foram os estados com os maiores volumes de população natural residindo em outras unidades da federação. A maior parcela dos não naturais residentes no Rio de Janeiro nasceu em Minas, Paraíba e Ceará, que, juntos, alcançaram 45,9% do total de não naturais.

Evangélicos se casam mais 
Segmento é o que registrou o maior percentual de uniões formais entre todas as religiões, de acordo com o Censo 2010. Maior quantidade de divórcios ocorre entre os espíritas 
Flávia Ayer e Paula Sarapu
 “Se os evangélicos se casam mais, é porque essa é a orientação da Bíblia”, diz o pastor Sérgio Ricardo Carvalho de Oliveira, de 38 anos, casado há 13 anos com Aline Pereira de Oliveira, de 32. É dessa forma que o líder religioso justifica o fato de haver maior concentração de casados entre os evangélicos do que em qualquer outra religião, de acordo com dados do Censo 2010, divulgados ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O grupo em Minas conta com 43% de casados e apenas 19,9% de uniões consensuais.

Com dois filhos, Sérgio Ricardo e a mulher se conheceram na igreja, no grupo de jovens do qual também participava o irmão dela. O namoro durou três anos e meio e, então, eles assinaram os papéis e ganharam a bênção de Deus. Sérgio diz que casar e constituir família são objetivos de vida dos evangélicos, que passam pela importância da castidade, símbolo pregado à juventude. “Normalmente, os evangélicos se casam com pessoas da mesma religião por questão de afinidade, por convivência mais próxima e por buscarem as mesmas diretrizes para cuidar da família”, explica o pastor.

O levantamento do IBGE, que faz o cruzamento de dados de nupcialidade com religião e grau de instrução, aponta ainda maior percentual de divorciados entre espíritas e de uniões consensuais entre aqueles que se declararam sem religião. Enquanto a média de divorciados gira em torno dos 3% entre católicos e evangélicos, no grupo de espíritas, esse percentual chega a 6,9%. Já em relação às uniões consensuais, enquanto nas demais crenças os números não ultrapassam os 30%, entre o grupo dos sem religião, as uniões sem papel passado chegam a 47,7% do total.

De acordo com a analista do IBGE, a demógrafa Luciene Longo, os dados do Censo 2010 reforçam que o casamento formal está vinculado também com o perfil socioeconômico. “Casar formalmente é caro e, por isso, muitos casais com renda mais baixa optam por morar juntos e dispensam formalidades. Enquanto entre mineiros de 30 a 34 anos, com renda superior a 20 salários mínimos, o casamento no civil e no religioso chega a 64% das uniões, entre pessoas da mesma faixa etária e renda que vai de dois a três salários mínimos, 44% das uniões são firmadas no cartório e abençoadas na igreja. 

UNIÃO FORMAL
 A demógrafa Ana Paula de Andrade Verona, do Departamento de Demografia da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)/Cedeplar, reforça que a religião é apenas um dos aspectos que pode influenciar o casamento. No caso dos evangélicos, por exemplo, ela diz que algumas igrejas pentecostais assumem claramente a preferência pela união formal, mas lembra que a renda e a escolaridade contam também muito na decisão dos casais.

“Em geral, as igrejas pentecostais, que em grande parte são protestantes, falam sobre a preferência do casamento formal, como a melhor saída. Não se pode garantir só a influência da religião porque há outros aspectos que também se relacionam, como a renda e a escolaridade. Sabe-se que quem tem renda mais alta costuma formalizar mais a união também. Por isso, os espíritas poderiam estar mais expostos ao divórcio, uma vez que pertencem a uma das religiões com número de seguidores de renda mais alta e escolaridade maior", explica.

Segundo ela, os dados do IBGE são informações de momento porque, no caso da religião, permite-se mudança. “Intuitivamente, poderíamos dizer que o ateu não se casa formalmente porque não acredita em normas de comportamento, já que não tem uma crença religiosa nem frequenta a igreja. Mas não sabemos o passado dessa pessoa e por isso não dá para avaliar completamente essa relação", explica Ana Paula.
ESTADO DE MINAS
18/10/2012

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