sábado, 15 de fevereiro de 2014

Bahia de todos os nós - Antonio Risério

A Tarde/BA 15/02/2014


Antonio Risério
Escritor
ariserio@terra.com.br

Quando ouço
a conversa fiada de
que a Bahia é “de
todos nós”, penso
comigo mesmo:
sim, é de todos nós,
mas continua sendo
mais de alguns
do que de outros

A realidade baiana nos entristece a
cada passo. O índice de desemprego
em Salvador é o maior entre
as capitais brasileiras. E os números do
Bolsa Família, na Bahia, são escandalosos.
Para o governo estadual, um atestado
de incompetência. Para os baianos, sinônimo
de atraso e motivo de vergonha.
Enquanto Dilma Rousseff e seus colegas
fazem farras com dinheiro público dentro
e fora do país, 43% da população
baiana estão cadastrados no famigerado
programa. Nada menos que 1.8 milhão de
famílias, somando cerca de 6.5 milhões
de pessoas. É gente demais na miséria.
Gente demais de pires na mão. E o número
aumenta a cada ano, sem que nossos
governantes demonstrem disposição
e capacidade para enfrentar a questão.

Entrevistados, alguns ilustres economistas
locais fazem
comentários sobre
esse quadro de subcidadania.
E, quando
não se limitam a
emitir banalidades,
eles apenas deliram.
Um deles, por exemplo,
diz que as coisas
vão mudar nas próximas
gerações,
quando os filhos dos
beneficiários atuais
do Bolsa Família,
tendo acesso à educação,
poderão ingressar
galhardamente
no mercado
de trabalho. Quem diz uma baboseira
dessas quer nos enganar – ou se autoenganar.
Acesso à educação? Qual? Só se for
à mesma que tiveram os preparadíssimos
sindicalistas que hoje mandam e
desmandam no governo local.

Porque é o seguinte. No pé em que as
coisas estão, nenhum desses filhos das
famílias penduradas no programa vai ter
educação (qualificação) para ingressar
em boas condições no mercado de trabalho.
Pelo simples motivo de que nosso
ensino público – em todo o estado, mas,
principalmente, nas regiões mais pobres
– não prepara ninguém para nada. É um
ensino de merda. Afora isso, minha vontade
é dizer o seguinte ao doutor que deu
a declaração: pegue os 60 ou 70 reais do
Bolsa Família e tente matricular sua filha
num bom curso de informática ou de
inglês, por exemplo. Não vamos pensar
que peneira foi feita para tapar o sol. Pelo
andar da carruagem, os pobres e miseráveis
da Bahia se encontramsem perspectiva
alguma. Estão aprisionados no
círculo de ferro da subcidadania, da existência
infra-humana.

Os que fazem parte do governo seguem
repetindo: é preciso capacitar as pessoas,
qualificar a mão de obra. Se é assim, por
que não fazem isso? Por que não metem
a mão na massa e apostam fundo na
inteligência popular? Por que não investem
de fato nas pessoas? Porque, até prova
em contrário, falam da boca para fora.
Mais fazem o teatro da inclusão do que
realmente a promovem. E não adianta
ficar fazendo campanha publicitária para
dizer o contrário. É propaganda enganosa.
Quando ouço a conversa fiada de
que a Bahia é “de todos nós”, penso comigo
mesmo: sim, é de todos nós, mas
continua sendo mais de alguns do que de
outros.

Nossos governantes são engraçados. E
parece que pensam que somos todos cegos
ou burros. Diante dos números do
Bolsa Família na Bahia, a titular de um
desses ministérios inúteis que hoje enfeitam
o governo se justifica dizendo que
nossos problemas são antigos. Quando
questionam Sérgio
Cabral sobre as enchentes
devastando
casas e vidas no Rio,
ele diz a mesma coisa.
Aqui na Bahia, o
papo não é outro.
Ora, sejamos sérios:
quem está no governo
há dez anos, não
pode mais usar essa
desculpa esfarrapada.
Se não fez o que
deveria ter feito (e
teve tempo de sobra
para fazer), não jogue
a culpa no passado,
em seus antecessores
no posto, que isso é indecente.
Se Wagner tem hoje alguma “herança
maldita”, a herança é dele mesmo.

E desconfio que, se for pelo governo, a
pobreza vai se perpetuar. Outro dia, o
economista Eduardo Giannetti foi ao
grão da questão. Disse que vai ser muito
difícil derrotar Dilma Rousseff eleitoralmente,
pelo simples fato de que ela está
montada em 40 milhões de contracheques.
A observação vale para a Bahia. A
pobreza interessa a quem está no governo
e quer se manter no poder, pelo
que significa de desinformação e dependência.
Hoje, o curral eleitoral não é mais
geográfico. Pulverizou-se, preso agora às
rédeas ou coleiras da mesada assistencialista.

Um comentário:

  1. Eis aí um artigo oportuno e atual. Tudo foi posto de forma equilibrada e sensata, mostrando clara, e até mesmo com didaticamente, o descalabro da educação no Brasil atual. Não só. Um verdadeiro grito de alerta para as imprevisíveis consequências do uso do assistencialismo desbragado como programa de governo.

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