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O preço da intolerância
Casos de violência em casa contra homossexuais ultrapassam agressões nas ruas. Das 3.084 queixas, 38% são domiciliares
Julia Chaib
Estado de Minas: 09/03/2014
Brasília – O caso de
Alex Medeiros, de 8 anos, espancado até a morte pelo pai, Alex André, de
35, em 17 de fevereiro, no Rio de Janeiro, trouxe à tona mais um
retrato de uma intolerância que não ocorre apenas nas ruas, mas, também,
dentro de casa. Em depoimento à polícia, o pai da criança disse que
bateu no filho para “dar um corretivo” porque ele tinha de “andar como
homem”. A atitude violenta de Alex se encaixa em um perfil de violações
que ocorrem Brasil afora. No último balanço disponível da Secretaria de
Direitos Humanos (SDH) da Presidência da República sobre violência
homofóbica, com as denúncias feitas à pasta em 2012, os casos de
violação motivados pela orientação sexual e de gênero, em casa,
representam 38,63% dos registros, seguido pelas agressões na rua, com
30,67% do total de 3.084 queixas.
Ainda segundo o
relatório, 61,47% das violações ocorrem com pessoas de 12 a 29 anos.
Alex estava abaixo dessa faixa etária, mas ilustra os casos de violência
com jovens em casa, segundo especialistas. De acordo com o conselheiro
tutelar Rodrigo Coelho, Alex André disse, em depoimento à polícia, que
batia no menino porque era uma forma de corrigi-lo. O pai se incomodava
com o fato de o filho gostar de dança do ventre, de lavar louça e de não
querer cortar o cabelo. O homem declarou também que Alex era
desobediente. “Pelo relato familiar, era uma criança ‘rebelde’, que não
respeitava os pais, mas o que consta no relatório escolar da criança diz
totalmente o contrário, que ele era um menino inteligente, calmo,
tranquilo”, disse ao Estado de Minas.
Luiz Mott, antropólogo da Universidade Federal da Bahia (Ufba) e fundador do Grupo Gay da Bahia (GGB), acredita que a homofobia não tem retrocedido no Brasil e que faltam políticas para educar a população sobre o tema. “Existe no imaginário coletivo do machismo brasileiro essa pena de morte do filho homossexual”, diz. Já a doutora em psicologia com atuação em estudos de gênero Tatiana Lionço ressalta que, nesse caso, a violência corretiva para impedir que a criança seja gay ou “mulherzinha” é praticada contra uma pessoa que sequer consegue compreender o que ocorre à sua volta. “A criança não faz ideia do que é ser um homem afeminado, por que seria inapropriado brincar com certas coisas”, observa Tatiana.
Luiz Mott, antropólogo da Universidade Federal da Bahia (Ufba) e fundador do Grupo Gay da Bahia (GGB), acredita que a homofobia não tem retrocedido no Brasil e que faltam políticas para educar a população sobre o tema. “Existe no imaginário coletivo do machismo brasileiro essa pena de morte do filho homossexual”, diz. Já a doutora em psicologia com atuação em estudos de gênero Tatiana Lionço ressalta que, nesse caso, a violência corretiva para impedir que a criança seja gay ou “mulherzinha” é praticada contra uma pessoa que sequer consegue compreender o que ocorre à sua volta. “A criança não faz ideia do que é ser um homem afeminado, por que seria inapropriado brincar com certas coisas”, observa Tatiana.
Mott e Lionço concordam com a análise de que o fato de a homofobia não ser tipificada como crime contribuiu para o alastramento dos casos de violência. Desde 2001 tramitava no Congresso Nacional o Projeto de Lei 122, que tornava inafiançável e imprescritível o crime de discriminação de homossexuais. Mas, no fim do ano passado, uma manobra do Senado fez com que o texto passasse a tramitar com o novo Código Penal. Para ativistas e defensores do projeto, isso representa uma perda de força do PL, que não tramitará mais isoladamente. Outro retrocesso em termos de política pública, para os especialistas, é o fato de o chamado “kit gay”, que continha material didático-pedagógico sobre gênero – e que deveria ser distribuído nas escolas –, ter sido barrado pela presidente Dilma Rousseff, em 2011.
CRIMINALIZAÇÃO O coordenador-geral de Direitos LGBT da Secretaria de Direitos Humanos, Gustavo Bernardes, também considera fundamental a criminalização da homofobia. "Não para colocar alguém na cadeia, mas por uma questão pedagógica. É importante que as pessoas saibam que o Estado não tolera nem compactua com essa violência. A forma de mostrar isso é ter uma legislação que criminalize", diz. Segundo Bernardes, a Noruega, a Suécia e o Chile já têm legislações a esse respeito.
O coordenador lembra que a expulsão de casa ou o abandono por parte dos pais estão entre os tipos de violência praticados. Segundo ele, a secretaria está buscando formas de conscientizar a população a lidar com esses casos. “Há três anos o Conselho Nacional da Criança e do Adolescente abre uma parte específica do edital para trabalhar com adolescentes LGBT. Mas não aparece trabalho. O que queremos é sensibilizar pessoas e entidades para atuar nessa área.”
Bernardes diz ainda que o Sistema Nacional LGBT, que prevê a articulação de políticas com estados e municípios, está sendo implementado. E há 17 termos de cooperação com secretarias de segurança pública do país para preparar policiais e fornecer atendimento adequado a vítimas de homofobia dentro e fora dos presídios.
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