sábado, 8 de fevereiro de 2014

O desviante - José Castello

O Globo 08/02/2014

HISTÓRIAS E BREVES NOTAS - GONÇALO M. TAVARES

O Globo 08/02/2014

Sergipe e Bahia - Luiz Mott

A Tärde/BA 08/02/2014

Luiz Mott
Professor titular de Antropologia da Ufba
luizmott@oi.com.br

A história oficial de Sergipe começa
em 1591, quando luso-baianos fundam
a cidade de São Cristóvão no
estuário do Vaza-barris, após sangrentas batalhas
contra os tupinambás. Como já existia
no recôncavo da Bahia Sergipe do Conde,
chamaram a novel conquista de Sergipe o
Novo, depois, Sergipe del Rey. Muitos dos
soldados baianos que participaram desta
conquista obtiveram grandes sesmarias,
comprometendo-se a povoá-las. Também
alguns delinquentes sentenciados pelo visitador
do Santo Oficio em Salvador tiveramSergipe
como lugar de degredo. Ordens
religiosas originalmente instaladas na Bahia
fundaram missões e novos conventos
em São Cristóvão, Santo Amaro das Brotas,
Tomar do Geru e outras freguesias.

Por 230 anos Sergipe foi comarca da Bahia,
e mesmo tornando-se capitania independente
em 1820, nem por isso deixou de ser considerada
e tratada como uma espécie de “quintal
da Bahia”, apodo considerado ofensivo pelos
sergipenses. Gregório de Mattos consagrou
esse estigma ao assim descrever a capital sergipense
nos finais dos seiscentos: “três dúzias
de casebres remendados, seis becos de mentrastos
entupidos, quinze soldados rotos e despidos,
doze porcos na praça bem criados, de
Sergipe del Rey, esta é a cidade...”

Já publiquei artigo sobre as seletas filhas de
senhores de engenho da vizinha comarca que
tomaram hábito no Recolhimento da Soledade
e outros conventos soteropolitanos. Destacados
sergipanos aqui brilharam e brilham nas
ciências, artes, política e negócios: José Calasans,
Thomas Cruz, Bernardino de Souza,
Mário Cabral, Geraldo Sobral, Lourival Batista,
Marcelino do Tem Postal, Selma Fraga Costa,
Paes Mendonça, Lícia Fábio, Jenner Augusto,
entre outros. Incontáveis sergipenses dedicam-
se ao comércio nos mercados de Salvador
e interior, quase todos ostentando fenótipo
típico de descendentes de puros portugueses
do Minho, do tipo “galego”, de pequena estatura,
olhos e cabelos claros.

Aracaju propagandeia ser o melhor fim
de semana da Bahia... Vale conferir!

Dinâmica saudade - Walter Queiroz Jr.

A Tarde/ BA 08/02/2014

 Walter Queiroz Jr.
Advogado, poeta, compositor, membro da
Confraria dos Saberes
waljunior44@hotmail.com

Sentimento melancólico, acorrentado ao
passado, saudade assim não me interessa,
é saudosismo. Agora, uma dinâmica saudade
que celebre e atualize acontecimentos
felizes, paramentando novas esperanças, esta
me apraz. Ninguém poderá banhar-se duas
vezes nas mesmas águas de um rio, nos lembra
o grande Heráclito, assim como novos beijos de
amor jamais serão os mesmos de outrora, mas,
certamente, poderão tornar-se saudosas carícias
no... futuro.

Não advogo, como querem alguns dos meus
detratores, uma volta aos antigos carnavais. Propugno,
sim, pela reedição dos seus valores eternos
nos carnavais atuais, onde estão ausentes a
poesia e o humor. Minha geração vestiu lindas
fantasias, chorou de dor e alegria, dançou e
cantou marchas e sambas que se (éter)nizaram
no imaginário do Brasil. De ponta a ponta, um
país vivenciando um mágico carnaval feliz.
Uma folia ritualizada, com dia e hora para
começar e acabar, onde cada minuto era precioso
e inesquecível, e se alguém quiser mesmo
saber o que significa uma saudade, pergunte a
um pierrô apaixonado pela dor de silêncio
devastador de uma quarta-feira de cinzas.

“Pobres moços”, parafraseando o grande Lupiscínio,
quando entregues à aventura vazia e,
meramente, hedonista, de um carnaval sem
alma, preferindo o conforto tedioso dos camarotes,
enquanto corações sonhadores brincam
nas ruas, sonhando ardentes paixões.

Este ano, o legendário Bloco do Jacu faria
50 anos, não tivesse sido alijado das avenidas
pela estridência eletrônica e predadora
desse modelo de carnaval. Há um projeto
da Saltur em andamento no sentido de,
juntos com a turma do Barão, coirmão de
históricos carnavais, possamos nos reunir,
filhos e netos, na grande festa, em local e
data a serem anunciadas.

No dia 22 de fevereiro, na AAB (Associação
Atlética da Bahia), faremos a terceira edição da
batalha de confete “Recordar é viver”. Em nome
da dinâmica saudade que une gerações, também
a nossa renovará seus abraços e canções,
com o privilégio depoder rememorar... um
cheiro de lança no ar!

Racismo e rolezinho - JC Teixeira Gomes

A Tarde/BA 08/02/2014

JC Teixeira Gomes
Jornalista, membro da Academia de Letras da
Bahia
jcteixeiragomes@hotmail.com

Precisamos evitar
no Brasil o exercício
do pensamento
que discrimina a
pretexto de combater
a discriminação.
Precisamos combater
o racismo
ao contrário

Tenho evitado escrever sobre racismo pela delicadeza de um tema que traduz imensas dívidas da sociedade brasileira para com a população negra. Mas dois artigos recentes sobre rolezinhos me fizeram mudar de ideia, um do meu amigo Jorge Portugal, outro do deputado petista Luiz Alberto. O primeiro vê tais manifestações como “caso de política”. Há anos, diz ele, os garotos de bairro populares, sobretudo negros, sentiam-se discriminados no “pedaço dos barões” (!), incluindo shoppings. Hoje, resolveram ocupar tais espaços “com a linguagem de seus corpos jovens e mestiços”.

Já para o petista Luiz Alberto, radical e contundente, discriminações em shoppings paulistas contra “jovens da periferia, na maioria negros” (sic), “num lugar onde não são esperados”, causariam pânico. A denúncia acusa “uma reação das pessoas brancas” (!), incomodadas como donas do “espaço do poder”, revelando “a face perversa” da exclusão orquestrada por brancos ricos contra negros pobres. Só faltou dizer que a Ku Klux Klan invadiu shoppings brasileiros para expulsar negros, num texto agressivo, cuja ideologia rançosa expõe objetivo eleitoreiro.

Não é a cor da pele que define presenças em shoppings: é o seletivo e excludente consumismo capitalista. Empresários não vacilam diante de lucros: o megaempresário Odebrecht está construindo em Cuba um porto para o comunista Fidel, com o farto dinheiro enviado pelo PT de Luiz Alberto. Não me consta que Pelé tenha sido barrado em um único shopping do mundo.

Templos do consumismo, shoppings são também centros de convivência social. À comodidade da concentração de lojas, acrescentam o prazer dos passeios em segurança. Sendo espaços limitados, grandes massas em seu interior podem intimidar fregueses, dificultar vendas e ameaçar patrimônios. Não por causa específica da presença de jovens negros: rolezinhos são formações compósitas e incluem negros, brancos, mulatos, louros, índios etc., como o próprio Brasil. Multidões em áreas fechadas podem ser ordeiras ou ficar imprevisíveis como bois em curral, doidos para arrombar a cerca ante um simples estalo. Lembremos que arruaceiros desvirtuaram as manifestações pacíficas do povo nas ruas brasileiras em 2013.

Precisamos evitar no Brasil o exercício do pensamento que discrimina a pretexto de combater a discriminação. Simplificando: precisamos combater o racismo ao contrário. Desde alguns anos, generalizou- se a absurda ideia de que usar a palavra “negro” era ofensa racial e passaram a trocá-la por “afrodescendente”. Mas os linguistas que o professor Jorge Portugal tão bem conhece lembram que existe o vocábulo “polissemia”, para explicar os conteúdos múltiplos das palavras. “Negro” pode designar não apenas a cor da pele, mas também “escuridão”, “treva” ou “dificuldade”, como ocorre quando dizemos “a situação está negra”. A eficiente repórter de TV Glória Maria já afirmou, com orgulho: “Eu não sou afrodescendente, eu sou é negra!”

Qualquer exaltação de uma raça particular é racismo. Na década de 70, quando eu chefiava o Jornal da Bahia, fui procurado pelo emérito sociólogo Thales de Azevedo, que me advertiu, ao ler que o setor de promoção do jornal realizava o concurso “A Mais Bela Mulata da Bahia”. Thales disse: “Vocês estão fomentando o racismo!”. O mestre estava certo. Hoje, no entanto, tornaram-se comuns no Brasil designações como “Dia da Beleza Negra”, da “Cultura Negra”, conjunto “Raça Negra”, há uma revista, “Raça”, dedicada apenas a negros, etc. Imaginem Jorge Portugal e o deputado Alberto se alguém andasse elogiando um conjunto “Raça Branca”!

Enfim, preocupados ambos em denunciar o rolezinho como a revolta de negros pobres contra brancos opressores, andam esquecidos de fazer o que deveriam: enaltecer o mais aplaudido negro do Brasil atual, emergente da pobreza para tornar nossa Justiça respeitada: refiro-me ao magistrado Joaquim Barbosa, que, aliás, meteu o branquelo Dirceu e outros petistas corruptos na Papuda, resgatando a dignidade nacional. Garanto a meus articulistas que o negro Joaquim Barbosa frequenta shoppings sob aplausos.